Próprio punho

Professora Michèle Sato fala sobre o Zoneamento de Mato Grosso


Reservas extrativistas

Batalha entre floresta e gado na Amazônia

A criação das Resex foi a vitória daqueles que se opunham ao desmatamento

09/11/2010

Mario Osava
Rio Branco (Acre)
“Agarre na mão de Deus”, disse sua mãe ao falecer. Só mais tarde compreendeu que ela, enquanto agonizava com falência dos rins, o exortava a continuar seu trabalho de evangelização católica.
Era 1980, e viviam isolados no seringal de Iracema, como uma grande família formada por dezenas de adultos, meninos e meninas, sobrevivendo do que a selva amazônica oferecia e da venda de látex natural extraído da seringueira.
Aldeci Cerqueira Maia, o “Nenzinho”, tinha 18 anos e havia se casado há pouco quando sua mãe morreu. Extrator de borracha desde os nove anos, guarda até hoje, “como um talismã”, uma das primeiras pelotas que fez com esse produto. Seus avós foram “soldados da borracha”, levados do Nordeste para a Amazônia durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) para abastecer de borracha os exércitos aliados.
Mais tarde, o Estado do Acre começou a receber novos visitantes interessados, não nos frutos da floresta, mas em derrubá-la e implantar a pecuária e alguma plantação. Os assentamentos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) restringiam o seringal. Quando, em 1986, o Incra se preparava para ocupar parte dos seringais para assentar os agricultores, os cultivadores de borracha ameaçados de expulsão uniram-se no “empate”, uma forma de resistência pacífica que levou multidões a se opor ao desmatamento.
“Conseguimos parar a expropriação do Incra”, disse Nenzinho, mas foi preciso uma longa luta até que o triunfo se formalizasse na criação da Reserva Extrativista (Resex) Cazumbá-Iracema, em 2002. Resex é uma área de proteção ambiental onde seus moradores tradicionais têm direito ao uso sustentável dos recursos naturais e benefícios como subsídios ao preço da borracha. Esta foi a vitória do “empate”, um invento de Chico Mendes, herói dos povos da floresta amazônica, no qual os seringueiros formavam barreiras humanas para impedir o corte da floresta.
Mas a criação dessas reservas custou sangue e conflitos. Chico Mendes foi assassinado em 1988 por pecuaristas em Xapuri, cidade do leste do Acre. Oito anos antes, já haviam matado Wilson Pinheiro, outro líder de seringueiros e trabalhadores rurais. O primeiro legado de ambos foi a criação, em 1990, da Resex Chico Mendes, com 970.570 hectares, onde vivem hoje cerca de 1.800 famílias.
Nenzinho sobreviveu a duas ameaças de morte, uma delas por ter denunciado um delegado por caça ilegal. Mas sempre contou com a proteção e o apoio do padre Paolino Baldassari, cura italiano já octogenário mas ativo, que formou gerações de ativistas católicos e animou todas as lutas dos pobres em Sena Madureira, município sede da Resex Cazumbá-Iracema.
O sucesso da resistência do seringal Iracema e de sua própria liderança, Nenzinho atribui à pregação religiosa iniciada por sua mãe e seguida por ele, sempre sob orientação de padre Paolino. “O ser humano não vive apenas de pão, e tampouco só de oração”, disse ter aprendido Nenzinho, que decidiu também cuidar da saúde de seus vizinhos, capacitando-se como agente sanitário e depois enfermeiro.
As visitas frequentes a todas as famílias locais o fizeram padrinho de meninos e meninas de 56 famílias. “Era compadre de todos”, contou. Porém, uma brutal queda no preço da borracha na década de 1990 ameaçou desfazer sua comunidade. Muitos abandonavam o seringal. Os persistentes criaram uma cooperativa e Nenzinho, com as facilidades de agente de saúde da prefeitura, transportava a produção de todos para vender na cidade, fazendo com que economizassem custos e tempo.
O transporte por animais demorava quase um dia inteiro, já que não havia estradas, apenas caminhos escorregadios quando chovia. Em 1992, o preço caiu mais ainda e “não havia compradores”. Nenzinho decidiu salvar um mínimo da comunidade convidando dez famílias a se somarem à extração de castanha com o que ele e seus parentes conseguiam alguma renda, graças à sorte de viver junto a um grande castanhal. Como a colheita de castanha se limita ao primeiro trimestre, também recorreu ao cultivo de arroz, feijão, banana e outros alimentos no restante do ano.
“Foi difícil” mudar os hábitos de extratores acostumados à carne de caça. “Tivemos que aprender a comer outras coisas. Eu mesmo precisei me domesticar”, admitiu Nenzinho. Outro triunfo foi a abertura de um ramal viário até a Resex, “uma missão impossível, mas realizada”. Em 1997, chegou o primeiro automóvel, entre choros “de emoção”, contou. “O transporte é tudo”, afirmou, embora a terra escorregadia impeça o tráfego de veículos a maior parte do ano.
Cazumbá-Iracema também foi a “primeira comunidade extrativista a ter ensino médio no Acre”, destacou orgulhoso. São 15 alunos no secundário e 96 no ensino primário, informou a professora Algecida Cerqueira, em sua casa de madeira, no povoado principal da Resex. “Nasci aqui e fundei a escola em 1993”, contou, dizendo que a juventude “quer ficar aqui”, ao contrário dos filhos de camponeses assentados nos arredores. Um exemplo é Ronaldo Santos, de 18 anos, que pensa em estudar biologia em alguma cidade e depois voltar para pesquisar “a floresta cheia de mistérios”.
Finalmente, em 2002, o governo federal decretou a criação da desejada Resex Cazumbá-Iracema, com 750.975 hectares. Isso lhes dá subsídios que elevam para R$ 3,20 a renda obtida por um quilo de borracha, 2,7 vezes o preço do mercado, mas equivalente a apenas um terço do poder de venda de 1980, segundo Nenzinho. O seringueiro hoje cuida de sua Resex como funcionário do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, órgão do Ministério do Meio ambiente encarregado das unidades de conservação, como Resex, Parques e Florestas Nacionais.
A população local aumentou para 320 famílias que, para melhorar sua renda, tentam diversificar a produção. Além da castanha e da pequena agricultura, desenvolvem o artesanato, especialmente com o emborrachado, de látex com o qual fazem grandes pinturas e mouse pads em forma de árvores amazônicas. Na Resex Chico Mendes já se usa o látex para fabricar camisinha e a “folha defumada”, espécie de couro vegetal usado para fazer calçados.
Contudo, parece insuficiente. Há dois anos foram descobertas milhares de cabeças de gado e uma grande área desmatada na reserva, violando os objetivos da área protegida. O Incra executou no Acre projetos de “colonização” e criou assentamentos causando um amplo desmatamento ao longo das estradas nas décadas de 1970 e 1980, mas depois mudou sua forma de atuar, incorporando a dimensão ambiental e aproximando-se do espírito das Resex, explicou João Ricardo de Oliveira, chefe de Planejamento do Instituto no Estado.
O objetivo do regime militar da época era ocupar a Amazônia, com a filosofia de “integrar para não entregar” a soberania da região, e também assentou milhares de deslocados por projetos hidrelétricos no sul, sem nenhuma preocupação ambiental, explicou. No Acre chegaram menos deslocados do que no vizinho Estado de Rondônia, que foi um exemplo negativo do amplo desmatamento e disseminação da malária.
Agora, procura-se criar uma Zona Econômica Ecológica no Acre, e os assentamentos evitam áreas de floresta nativa ou são feitos de forma sustentável, assegurou. O novo modelo será testado logo no assentamento dos “basivianos”, camponeses brasileiros expulsos da faixa fronteiriça com a Bolívia. “Temos uma lista de 417 famílias”, disse João Ricardo.

Fonte: http://www.brasildefato.com.br/node/4580

ZSEE de Mato Grosso II

Projeto quer reduzir reserva legal em Mato Grosso

RODRIGO VARGAS

DE CUIABÁ
A Assembleia de Mato Grosso aprovou um projeto que reduz áreas passíveis de preservação no Estado e diminui o percentual de recomposição de reserva legal.
Aprovado por 19 votos a um, o projeto substitui o zoneamento socioeconômico e ecológico que havia sido proposto pelo ex-governador Blairo Maggi (PR), após três anos de reuniões técnicas e audiências públicas.
O zoneamento estipula uma série de indicações para o uso e a ocupação dos 90 milhões de hectares do Estado.
Em relação à proposta original, aumentam em 67% as áreas destinadas à "intensificação das atividades agropecuárias": de 23 milhões de hectares para 39 milhões de hectares, um acréscimo equivalente ao território do Acre.
As áreas destinadas à criação de unidades de conservação, que no texto anterior chegavam a 5,5 milhões de hectares, caíram 73%.
O principal articulador foi o deputado Dilceu Dal Bosco (DEM). Segundo ele, a versão anterior, que havia recebido o apoio dos ambientalistas, poderia "engessar" o desenvolvimento do Estado.
"Manter o texto original seria algo gravíssimo. Áreas já abertas e consolidadas seriam engessadas e teriam, por exemplo, dificuldades em obter financiamento", disse o deputado.
Editoria de Arte/Folhapress
O material aprovado também indica o "plantio da cana-de-açúcar e a produção sucroalcooleira" em áreas já abertas no Estado, excluindo as áreas alagáveis. Segundo ambientalistas, o texto abre caminho para o plantio de cana nas terras altas do Pantanal e na Amazônia.
Outro artigo diz que, para fins de recomposição florestal, o percentual de reserva legal cai de 80% para 50% de cada propriedade rural.
O projeto receberá redação final e vai ao governador Silval Barbosa (PMDB) para sanção ou veto. Reeleito no primeiro turno, Barbosa disse que só irá se pronunciar após receber o texto final.
De acordo com a diretoria de Zoneamento Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, os zoneamentos estaduais podem prever a redução da reserva legal para fins de recomposição.
A proposta de Mato Grosso, porém, só passa a vigorar após ser submetida à avaliação técnica da CCZEE (Comissão Coordenadora do Zoneamento Ecológico-Econômico), formada por representantes de 15 ministérios.
Por meio de nota, a ONG ICV (Instituto Centro de Vida) disse que o zoneamento de MT "contradiz os compromissos assumidos perante a comunidade internacional, que preveem a redução do desmatamento e a promoção da agricultura de baixas emissões de carbono".
Um manifesto assinado por 27 entidades, entre elas o Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), será entregue hoje ao governador Silval Barbosa. O documento pede o veto integral ao projeto aprovado pelos deputados. "A versão atual apresenta inconsistências técnicas, além de desperdiçar um grande orçamento já destinado aos seus estudos."
Fonte: 

ZSEE de Mato Grosso


Silval pode enfrentar um bombardeio, devido ao zoneamento ecólogico montado ao gosto dos ruralistas. Já se fala em tentar provocar um boicote internacional aos produtos do agronegócio, como a soja e a carne produzidos em Mato Grosso

04/11/2010 - 22:14:00

Repúdio ao ZSEE pode repercutir mundialmente

Por Keka Werneck
Da Assessoria de Imprensa do Centro Burnier Fé e Justiça






A sociedade civil organizada emitiu manifesto de repúdio contra o substitutivo 3 do Zoneamento Socioeconômico e Ecológico de Mato Grosso (ZSEE-MT), aprovado em segunda votação, por 19 votos a um, na sessão do dia 27 de outubro, na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (AL-MT).

O manifesto pode ter repercussão mundial contra o ZSEE de Mato Grosso, devido às relações dos ambientalistas em todo o planeta.

Cerca de 30 movimentos sociais, ambientalistas ou não, pedem, no manifesto, o veto sensato do governador Silval Barbosa (PR).

Uma comissão entregará o pedido de veto em mãos nesta sexta-feira (5).

O deputado estadual Alexandre César (PT), relator do projeto original, informa que o parecer técnico da Procuradoria Geral do Estado (PGE) é contrário ao substitutivo. E que isso deve nortear o governador.

Para a professora da UFMT Michèle Sato, pós-doutora em Educação e referência na luta ambiental em Mato Grosso, “o substitutivo 3 reforça inteiramente grupos econômicos hegemônicos ligados ao agronegócio”. Ela avisa, porém, que “eles mesmos serão vítimas, já que a economia internacional poderá desprezar produtos oriundos de ordenamento territorial inconsequente, sem nenhum cuidado ambiental”. Já se fala em tentar provocar um boicote internacional e principalmente europeu aos produtos do agronegócio, como a soja e a carne. Entende-se que a opinião pública europeia já é sensibilizada contra ações que signifiquem ataque à Amazônia e ao meio ambiente.

A professora destaca ainda que “ao impactar os diversos territórios mato-grossenses, estaremos também acarretando problemas amazônicos, mundiais e planetários. Tudo o que existe na Terra tem ligação ecológica. O substitutivo 3 é totalmente desprovido de inteligência”, reage Michèle Sato, que, por meio da Rede Mato-Grossense de Educação Ambiental (Remtea), vem atuando nessa luta.

Todos os deputados da AL-MT seguiram o relator da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), deputado Dilceu Dal Bosco (DEM). Exceto o deputado estadual Ságuas Moraes (PT), que, isolado, vetou o substitutivo.

No manifesto, o projeto é apelidado de “substitutivo ruralista”.

Na visão de Alexandre César (PT), a forma como o ZSEE foi aprovado demonstra a força do agronegócio na Assembleia Legislativa de Mato Grosso.

“Infelizmente, tenho imensa dificuldade de achar benefícios no substitutivo como ele foi aprovado”, lamenta Alexandre César, visivelmente abalado com o rumo do projeto. Para ele, a Casa desconsiderou todo o percurso de debates públicos, não atendeu às reivindicações de ambientalistas nem da sociedade civil organizada, que, na opinião dele, foram participativos e ativos para conduzir a questão de forma democrática. “Os parlamentares estão apenas regulamentando as coisas como estão. É a história do vale tudo. Do vamos deixar como é para ver como que fica. Isso daí não tem efetividade”.

Segundo Inácio Werner, do Centro Burnier Fé e Justiça (CBFJ), que é signatário do manifesto, essa discussão vem sendo feita deste o início da década de 90. “Naquela época, de 200 milhões de dólares disponibilizados pelo Prodeagro (Programa de Desenvolvimento Agroambiental do Estado de Mato Grosso), 30 milhões foram destinados a um estudo técnico. Ou seja, até mesmo o gasto de altas verbas públicas em todo o processo foi ignorado pelos deputados”, rechaça Werner. O CBFJ integra o Fórum Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad).

Conforme o deputado Dilceu Dal Bosco (DEM), a matéria tramitou em um processo legislativo perfeito. Foram feitas 15 audiências públicas. E, segundo ele, a redação final contempla a realidade de Mato Grosso, ou seja, “proteger o meio ambiente produzindo”. Ele disse não conseguir ver discordância entre o que a sociedade pediu e a AL aprovou.

A diferença central está no que motivou as mudanças no projeto, que tem como pano de fundo um estado que aloja o Pantanal, o Cerrado e a Floresta Amazônica. “Ao invés de levar em consideração estudos técnicos e discussões, que apontavam para uma mais ampla preservação, o substitutivo 3 atende à pressão política do agronegócio”, explica Werner. Reduz, segundo ele, áreas de conservação, sendo que algumas delas simplesmente deixam de existir. Reduz áreas indígenas, acuando ainda mais os povos. Permite o plantio de cana de açúcar em qualquer área do Estado, contrariando legislação vigente que protege o Pantanal e a Amazônia deste tipo de produção agrícola, que usa venenos altamente poluentes. Um risco ao solo e aos rios. Enfim, mexe totalmente no uso da terra e, na visão das entidades que assinam o manifesto de repúdio, vai na contramão do pensamento ambiental que se amplifica no mundo.

Mas, conforme Dal Bosco, o governador, antes de decidir, irá apreciar o parecer técnico da PGE e do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que através de uma resolução poderá ou não indicar o projeto. Além disso, segundo ele, a matéria exige ainda um decreto presidencial para ter validade.

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MANIFESTO DE REPÚDIO CONTRA A APROVAÇÃO SUBSTITUTIVO 3 DO ZSEE-MT


Desprezando os 20 anos de estudos técnicos, as 15 audiências públicas e as inúmeras expressões do controle social participativo pela sociedade civil, a Assembleia Legislativa [AL], entre as estratégias coloniais de dominação e manutenção do status quo, aprovou o Substitutivo 3 do Zoneamento Socioeconômico Ecológico [ZSEE] em 27 de outubro de 2010. Apelidado como “substitutivo ruralista” pela sociedade civil, agora ele deverá ser apreciado pelo Governador de Estado, e nas últimas instâncias, pela Comissão Coordenadora do Zoneamento Nacional [CCZEE] e pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente [CONAMA]. As entidades que assinam este manifesto clamam pelo SENSATO VETO DO GOVERNADOR, pelos seguintes motivos:



1.    O processo de construção e tramitação do terceiro substitutivo, desde a segunda votação na plenária, atropela normas regimentais na questão da transparência e lisura.  O deputado Dilceu Dal Bosco e as Lideranças Partidárias, desconsiderando a diversidade das contribuições da sociedade mato-grossense que resultaram no primeiro substitutivo, elaboraram um documento às pressas que contempla o setor do agronegócio comprometido com seus próprios interesses.  Outro indício de falta de transparência é atribuído ao fato de que o deputado Dilceu Dal Bosco foi indicado, uma semana antes da segunda votação, como o relator da própria proposta, o que evidencia uma demonstração de conflito de interesse na aprovação dentro da comissão.



2.    A versão atual apresenta inconsistências técnicas, além de desperdiçar um grande orçamento já destinado aos seus estudos e gerará conflitos socioambientais na sociedade mato-grossense de várias ordens. Todo zoneamento deve ser avaliado pela Coordenação Nacional do ZEE, ligada à SDR/MMA, que já vem alertando, por meio de notas e entrevistas, para o descumprimento às normas técnicas exigidas pelo governo federal, se nela aprovado é encaminhado à CCZEE e ao CONAMA. O Ministério Público Estadual [MPE] também entregou, em março de 2010, ao então governador Blairo Maggi, um parecer técnico demonstrando sua preocupação com inconsistências que ameaçam a aprovação e que, se levadas adiante, serão motivo de intervenção da Instituição.



3.    O ZSEE aprovado pela AL é um contra-senso, pois além dos dilemas socioambientais, exclusão social e manutenção da desigualdade no campo, representa um ‘tiro no pé’ do próprio setor de base primária responsável por liderar a desconfiguração da proposta inicial. O mercado internacional de comodittes agrícolas, por pressão da sociedade, está atento a uma produção que segue, minimamente, as leis. Um Estado sem um Zoneamento reconhecido, fruto de um processo sem transparência, enfrentará seguramente restrições à venda da sua produção.



É importante destacar que os ZSEE já aprovados [Acre, Rondônia e BR163/PA] pelo CONAMA e CCZEE configuram-se como uma nova proposta democrática de planejamento e ordenamento territorial, especialmente à Amazônia, sempre visível aos organismos internacionais e transações econômicas essencialmente relacionadas ao agronegócio.



Os movimentos sociais formados pelas instituições que assinam este documento vêm se posicionando ao longo deste ano para evitar o retrocesso que marcou o processo de aprovação por parte da Assembleia. Além do nosso posicionamento que marca muito um enfrentamento a certos setores econômicos, estamos acima de tudo preocupados com o rumo não transparente, retrógado e irresponsável que configurou a aprovação do ZSEE pela Assembleia e seus reflexos para o desenvolvimento no Estado.



Neste sentido, e pelos motivos expostos acima, repudiamos a aprovação do substitutivo 3 do Zoneamento Socioeconômico Ecológico de Mato Grosso e vimos pedir pelo veto do Governador a este substitutivo 3, com retomada imediata na reformulação da proposta atual do ZSEE nos moldes do primeiro substitutivo.



Pelo veto do governador!

Pelo repúdio à aprovação do substitutivo 3 ZSEE-MT pela assembleia legislativa!



Cuiabá, 5 de novembro de 2010.



GRUPO DE TRABALHO DE MOBILIZAÇÃO SOCIAL, GTMS

E demais entidades e movimentos das redes socioambientais



Associação Brasileira de Homeopatia Popular, ABHP

Associação dos Docentes da Universidade de Estado de Mato Grosso, ADUNEMAT

Associação Rondonopolitana de Proteção Ambiental, ARPA

Centro Burnier Fé e Justiça, CBFJ

Coletivo Jovem de Meio Ambiente, CJMT

Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental, CIEA-MT

Conselho Indigenista Missionário, CIMI

Entidade Nacional dos Estudantes de Biologia, ENEBio

FASE Mato Grosso - Educação e Solidariedade, FASE

Fórum de Lutas das Entidades de Cáceres, FLEC

Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento, FORMAD

Grupo Cultural e Ambiental RAÍZES

Grupo de Estudos em Educação e Gestão Ambiental - UNEMAT

Grupo de Pesquisa de Movimentos Sociais e Educação, GPMSE-UFMT

Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, GPEA-UFMT

Instituto Caracol, iC

Instituto Centro da Vida, ICV

Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, IPAM

Instituto Gaia

Instituto Indígena Maiwu

Operação Amazônia Nativa, OPAN

Rede Axe Dudu

Rede Mato-Grossense de Articulação dos Povos e Comunidades Tradicionais, REMAR COMTRA

Rede Mato-Grossense de Educação Ambiental, REMTEA

Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso, SINTEP

Sociedade Fé e Vida

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

Resultados de Nagoya

O DNA da biodiversidade
Envolverde

4 de novembro de 2010 às 9:49h



Por Stephen Leahy*, para o Terramérica
O Protocolo de Nagoya de Acesso e Participação nos Benefícios dos recursos genéticos foi o êxito mais ambicioso da cúpula da biodiversidade, realizada no Japão


Os delegados na 10ª Conferência das Partes do Convênio sobre Diversidade Biológica aprovaram um plano raquítico para a hercúlea tarefa de frear o desaparecimento de espécies. O pacto sobre recursos genéticos foi a exceção. Os representantes de mais de 190 países concordaram em colocar sob regime de proteção 17% das terras e 10% dos mares e oceanos até 2020. Atualmente, estão protegidos menos de 10% das terras e menos de 1% dos mares. O objetivo inicial era chegar a 25% e 15%, respectivamente.

No acordo está incluído o Protocolo de Nagoya de Acesso e Participação nos Benefícios dos Recursos Genéticos, o êxito mais notável da COP 10, que de todo modo foi negociado por 18 anos. Este documento estabelece mecanismos para utilizar o material genético de plantas, animais e micróbios na produção de alimentos, remédios, insumos industriais, cosméticos e em muitas outras aplicações. Por “acesso” entende-se a forma como esses recursos são obtidos, e “a divisão dos benefícios” significa como são distribuídos os ganhos provenientes desse uso.

O aproveitamento dos recursos genéticos deve muito aos conhecimentos empíricos adquiridos pelos povos indígenas durante séculos de uso e observação. Os povos originários se consideram depositários e protetores de boa parte da biodiversidade do mundo e dos conhecimentos tradicionais. Sem um acordo internacional formal como este, é impossível terem esse papel reconhecido e que seja detida a exploração de materiais e técnicas, que ocorre há décadas diante de seus narizes.

“O Protocolo de Nagoya é um tratado magnífico. Fizemos história aqui”, disse Gurdial Singh Nijar, delegado malaio representando o grupo Ásia-Pacífico. “Com este tratado esperamos apagar a palavra biopirataria do vocabulário do mundo”, afirmou. A biopirataria é praticada por empresas que se beneficiam do conhecimento indígena sobre as virtudes das espécies biológicas, mas sem seu consentimento e sem compartilhar os lucros.

“Podemos viver com o Protocolo de Nagoya”, disse ao Terramérica a ativista Joji Cariño, da indígena Fundação Tebtebba, com sede nas Filipinas. O acordo sobre um tema complexo e polêmico foi alcançado no último minuto, graças à intervenção do ministro do Meio Ambiente do Japão, Ryu Matsumoto, segundo disseram delegados, como Nijar. “Representa um grande triunfo e, no geral, é muito bom”, afirmou Preston Hardison, da tribo tulalip, dos Estados Unidos.

“O Protocolo de Nagoya coloca os povos indígenas em condições de falar diretamente aos Estados sobre nossos direitos aos recursos genéticos e o valor do conhecimento tradicional no uso dos mesmos”, disse Hardison ao Terramérica. China e Índia queriam nacionalizar os recursos genéticos fronteiras adentro. União Europeia (UE), Canadá e Austrália, que possuem grandes indústrias farmacêuticas e cosméticas, apresentaram dura resistência às tentativas de incluir os produtos bioquímicos derivados de plantas e outras espécies, destacou Hardison.

Segundo Christine Von Weizsäcker, porta-voz da Aliança do Convênio da Diversidade Biológica (CDB Alliance), uma coalizão de organizações não governamentais, “este é um grande avanço para os países em desenvolvimento”. Em entrevista ao Terramérica, Weizsäcker declarou que “está longe de ser perfeito, mas oferece uma sólida base para o trabalho futuro”.

Para entrar em vigor, o Protocolo de Nagoya deve ser ratificado pelos países, e os governos terão de adotar leis e regulamentações nacionais sobre acesso e divisão dos benefícios para colocá-lo em prática. Desde logo, como ocorre com muitos tratados internacionais, os países podem escolher ignorá-lo, pois não contém nenhuma cláusula vinculante, destacou Hardison.

Embora pareça incrível, este documento pode ser o mais forte dos três pilares do Convênio sobre a Diversidade Biológica. O segundo pilar é o plano estratégico com 20 objetivos a cumprir antes de 2020, e cuja finalidade central é chegar a esse ano com um ritmo de extinção de espécies que seja a metade do atual.

“Acreditamos que ainda são necessárias metas muito mais ambiciosas para sustentar a ampla gama de serviços essenciais que os ecossistemas prestam ao bem-estar humano”, disse Russell Mittermeier, presidente da organização não governamental Conservation International, com sede nos Estados Unidos. “A conservação e o uso sustentável da biodiversidade precisa que o setor público realize investimentos catalisadores, estratégicos e bem dirigidos”, disse Mittermeier em um comunicado

Talvez, o pilar mais fraco seja o terceiro, o financiamento para implementar o Protocolo e o plano estratégico. No momento são destinados US$ 3 bilhões anuais à assistência ao desenvolvimento em matéria de biodiversidade e conservação. Os especialistas concordam que a quantia deveria ficar entre US$ 30 bilhões e US$ 300 bilhões. Contudo, em Nagoya não se conseguiu esse compromisso. “Precisamos aproveitar a energia desta reunião, onde vimos compromissos significativos e uma renovada vontade política, bem como dinheiro real” procedente de, por exemplo, Japão, disse Jane Smart, da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN).

Há duas semanas, quando começou a conferência em Nagoya, muitos países africanos, asiáticos e latino-americanos insistiram na importância de o Norte industrial assumir compromissos financeiros firmes. Como os Estados Unidos não são membro do Convênio sobre a Diversidade Biológica, a maior parte do dinheiro deve vir da UE, que sofre o impacto da recessão econômica. O bloco não assumiu novos compromissos financeiros. Segundo fontes das delegações, os países do Sul em desenvolvimento aceitaram que o prazo para esses compromissos se estenda até a próxima COP, que acontecerá na Índia em 2012. E, por outro lado, os governos das nações ricas aprovaram o Protocolo de Nagoya.

“A África exige que os doadores aumentem suas contribuições. Sem financiamento, este será um acordo vazio”, disse James Seyani, do Malaui, e porta-voz dos países africanos. “Estamos orgulhosos por haver um acordo sobre acesso e divisão de benefícios. Mas, voltamos a solicitar às nações doadoras que respondam ao nosso pedido de desenvolvimento de capacidades, para que possamos implementar este pacto em nossos países”, declarou Seyani no encerramento da conferência.
* O autor é correspondente da IPS.

http://www.cartacapital.com.br/carta-verde/o-dna-da-biodiversidade

Zoneamento Socioeconômico Ecológico de Mato Grosso é aprovado pela ALMT


Lei de Zoneamento do Mato Grosso joga no lixo 20 anos de estudos e US$ 30 milhões
[28/10/2010 10:24]
Projeto aprovado ignora propostas recolhidas em audiências públicas, carimba os produtos do agronegócio de Mato Grosso com selo da suspeição no mercado internacional e tem poucas chances de aprovação pelo Conama

O projeto de Zoneamento Socioeconômico e Ecológico (ZSEE) de Mato Grosso, da forma como foi aprovado na segunda-feira, 25, pela Assembleia Legislativa do estado, joga no lixo cerca de US$ 30 milhões investidos em 20 anos de estudos e discussões técnicas. De acordo com Roberto Vicentin, diretor de Zoneamento Territorial do Ministério do Meio Ambiente (MMA), foram realizadas 15 audiências públicas – algumas com tamanha participação que utilizaram estádios de futebol e ginásios de esporte –, e que deram origem a um documento do relator, o então deputado Alexandre Cesar (PT).
“O relator elaborou um substitutivo ao projeto original do Governo do Estado e incorporou grande parte das reivindicações das audiências públicas. A equipe técnica do Estado e nós do MMA avaliamos que aquele substitutivo era um ponto de convergência adequado, porque conciliava a base técnica com as aspirações e reivindicações da sociedade”, afirmou. Segundo o diretor do MMA, esse texto do relator foi atropelado pelo presidente da Comissão Especial de Zoneamento da Assembleia, Dilceu Dalbosco (DEM). “Ele não ficou satisfeito e elaborou, com técnicos que ele contratou, um substitutivo do substitutivo. E submeteu à votação da comissão essa terceira proposta. Não era nem o original do Estado, nem o substitutivo do relator, mas sim uma proposta que, com todas as letras, não tem sustentação técnica.”
A proposta foi duramente criticada também pelo Grupo de Trabalho de Mobilização Social, formado por representantes de instituições ligadas ao meio ambiente, educadores, indígenas, populações tradicionais e agricultura familiar do estado.
"Texto aprovado vai contra o próprio agronegócio"
Para Roberto Vicentin, o ZSEE aprovado vai contra os interesses do próprio agronegócio de Mato Grosso. “Da forma como havia sido apresentado e estava sendo ajustado no primeiro substitutivo do relator, dava um passaporte verde para as commodities de Mato Grosso. Mas, como foi aprovado, carimba a produção do agronegócio local com o selo da suspeição no mercado internacional. Isto porque, possivelmente, não terá respaldo do Conama, por falta de base técnica.”
A primeira votação do segundo substitutivo foi feita na noite de 30 de março, sem qualquer consulta à população. A segunda votação também foi realizada na surdina, sem nenhum aviso prévio. A proposta aprovada apresenta claras divergências em relação ao que foi debatido nas audiências públicas e sugerido pelos estudos. Diversos setores da sociedade mato-grossense apontam graves falhas técnicas, legais e sociais neste documento aprovado.
O ZSEE é um instrumento de grande importância para o planejamento estratégico do estado. Ele identifica potencialidades, vulnerabilidades e define a forma mais correta para o uso dos recursos naturais. No estado de Mato Grosso, pesquisadores e especialistas realizaram diversos estudos, ao longo de 20 anos, para trazer uma proposta viável de ZSEE, que atendesse à realidade econômica e socioambiental, mas esses estudos foram completamente desconsiderados na elaboração do substitutivo de Dalbosco. Agora o texto vai para sanção do governador.
“Houve um grande esforço do ex-governador Blairo Maggi para colocar o Mato Grosso na vanguarda da sustentabilidade, de livrar o estado da mancha de estado que mais desmatava, de levar essa nova política ao conhecimento internacional, de buscar uma boa proximidade com as ONGs socioambientalistas, e tudo isso ficará comprometido se o estado emplacar uma lei dessa natureza. Houve uma inversão radical da rota”, afirma Vicentin.
Proposta aprovada ‘rasga’ US$ 30 milhões
O ex-deputado Alexandre Cesar (PT), autor da primeira proposta para o ZSEE de Mato Grosso, afirma que o substitutivo aprovado alterou as bases técnicas e científicas da proposta original e entrou em flagrante contradição com a legislação federal. E, segundo ele, ainda joga fora o dinheiro investido. “Esse projeto rasga, literalmente, US$ 30 milhões investidos em estudos para formular uma proposta de zoneamento coerente. Agora, estamos longe de ter um ato jurídico que garanta o desenvolvimento sustentável do estado”.
Alexandre afirma ainda que o texto aprovado faz parte de uma estratégia para que Mato Grosso continue sem um ZSEE. “Este projeto nunca será aprovado pelo Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente) da maneira como está. Eu não tenho dúvidas de que isso faz parte de uma estratégia de setores que não querem que o estado tenha seu zoneamento”.
Todo o processo de discussão do zoneamento no estado foi marcado por forte participação do setor do agronegócio, de acordo com o diretor Vicentin, do MMA. “Eles se mobilizaram de forma legítima. O problema é que diante de uma correlação de forças desfavorável, os movimentos sociais, a agricultura familiar, os segmentos populares urbanos e a academia ficaram em situação extremamente desvantajosa. Porque predominou força da mobilização política, o poder econômico muito assimétrico. Então era natural naquelas audiências públicas uma pressão muito forte desses segmentos do agronegócio para alterar o enquadramento das áreas do estado nas diferentes categorias de uso que o zoneamento possibilitaria. Isso ocorria, sempre, no sentido de diminuir as condicionantes e as restrições que o zoneamento indicava.”
O zoneamento inicial, elaborado pelo Executivo, englobava diversas áreas numa categoria de uso mais restrito, que exigia maiores cuidados para determinados tipos de atividades. E o chamado setor produtivo pressionava nas audiências para que essas áreas mudassem de categoria – que passassem da categoria 2 para a categoria 1.
“A nomenclatura denomina a categoria 1 como áreas consolidadas. Então eles queriam jogar todas as áreas para as áreas consolidadas. Porque, supostamente, ao enquadrar uma determinada área ou um município na categoria de áreas consolidadas, haveria menos restrições para o uso dessas propriedades, dessas terras, sendo que na categoria 2 já havia exigência de cuidados e medidas de proteção ambiental, que na leitura feita pelo setor do agronegócio, implicaria maiores restrições e dificuldades para as atividades econômicas”, explica Vicentin.
Por trás de tudo, o novo Código Florestal
O diretor entende que por trás de tudo está a confiança do setor do agronegócio na aprovação do novo Código Florestal. “Eles apostam que o novo Código vai liberar geral, deixar tudo como está. Nesse caso, acreditam que quem desmatou, além de não ser obrigado a recuperar, não terá de pagar multa, vai ser perdoado. Uma atitude irresponsável contra o meio ambiente e contra os próprios negócios deles. Não se dão conta de que agindo assim estão comprometendo do ponto de vista comercial o agronegócio do Mato Grosso.”
Ele também vê dificuldades para que o Conama dê respaldo ao zoneamento da forma como foi aprovado pela Assembléia Legislativa. “A gente não pode falar nem decidir pelo Conama, mas para aprovar, o conselho vai precisar do parecer do Ministério do Meio Ambiente. E será muito difícil a comissão coordenadora do zoneamento, que envolve 14 ministérios, recomendar favoravelmente, sendo que o zoneamento não foi feito de acordo as diretrizes e as bases técnicas.”
ISA, Fernanda Bellei e Julio Cezar Garcia.

http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3200








       

Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Mato Verdinho

MANIFESTO
Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mato Verdinho
ARAGUAIA – MATO GROSSO – BRASIL

Reconhecemos a importância da biodiversidade e da beleza natural que fascina o mundo. E necessitamos aprender, igualmente, a reconhecer as diferenças culturais estampadas nas diversas identidades de um território brasileiro com vários Brasis. Os Retireiros do Araguaia são pessoas que vivem num lugar mágico, em uma área úmida de beleza inigualável, espraiando no verde do cerrado mato-grossense, entre as casas de palha e o cotidiano de lutas. Recebem este nome por retirarem o gado da área afetada pela cheia das águas, colocando-os em pastos de fazendas alugadas e devolvendo-os na seca, para que os novos ciclos se reiniciem. Este movimento dinâmico envolve membros das famílias e das comunidades em ritmo e pausa da organização social ligada ao compasso da natureza e, em rede, constituem a celebração da vida. Todavia, padecem na época da cheia, quando o gado vive em terras estranhas, extraindo a escassa economia dos Retireiros.

Desde 1999, os Retireiros buscam uma área protegida que possa favorecer a autonomia do trabalho, possibilitando a demarcação de um território próprio para suas sobrevivências e que lhes possibilitem uma vida digna por meio das escolhas democráticas e pela autonomia em gerenciar seus próprios ambientes. Além do gado, as atividades econômicas sustentáveis dos Retireiros, em função dos conhecimentos tradicionais de sua gente, favorecem a conservação da biodiversidade e da ecologia local. Solicitando ã então Ministra de Meio Ambiente Marina Silva, por ocasião de seu mandato, além das instâncias administrativas responsáveis como o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente de Recursos Naturais Renováveis [IBAMA], o processo já teve os laudos biológicos e socioeconômicos necessários, realizados pela coordenação do Prof. Dr. Carlos Walter Porto Gonçalves. Igualmente, teve apoio do Instituto Chico Mendes e Conservação da Biodiversidade [ICMBio] em 2009, resultando num relatório fundiário favorável ã criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável [RDS – federal], que também foi entregue ao IBAMA no mesmo ano.

Cumprindo todas as etapas, os signatários deste manifesto solicitam a realização imediata da última etapa, que consiste na Consulta Pública pelo ICMBio, ainda no ano 2010, pois os fazendeiros estão invadindo a área e expulsando os Retireiros de sua legítima territorialidade, além de outras ameaças cada vez mais opressoras, ameaçando não apenas as vidas humanas, mas toda riqueza que a natureza compõe a paisagem das áreas úmidas.

Aliando a beleza natural e cultural, este manifesto a favor dos Retireiros do Araguaia é um grito de luta para que a conservação da biodiversidade seja acompanhada pelo cuidado social de um território também defendido com amor por Dom Pedro Casaldáliga, admirado por todos nós.

Pela consulta pública em 2010!
Pela Vida!
E sempre pela esperança!

Cuiabá: 09 de outubro de 2010.
II Seminário de Mapa Social
VI Encontro da Rede Mato-Grossense de Educação Ambiental, REMTEA 

Os signatários

Conflitos socioambientais no Brasil


Mapa da Injustiça Ambiental


Pesquisador da FIOCRUZ Marcelo Frippo fala sobre o projeto que tem o objetivo de apoiar a luta dos atingidos pelo desenvolvimentismo insustentável
Por Flávia Londres*
A contaminação de ambientes rurais e residenciais e a intoxicação de trabalhadores e populações por agrotóxicos, assim como as disputas por terras, o desemprego e a insegurança alimentar provocados pela expansão do agronegócio constituem graves exemplos de injustiça ambiental e, como não poderia deixaria de ser, figuram em diversos casos do Mapa de Conflitos envolvendo Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil. Este instrumento constitui uma importante ferramenta de denúncia e de articulação em busca de soluções. O Mapa da Injustiça Ambiental é o resultado de um projeto desenvolvido em conjunto pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e pela FASE – Solidariedade e Educação, com o apoio do Departamento de Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde. Seu objetivo maior é, a partir de um mapeamento inicial, apoiar a luta de inúmeras populações e grupos atingidos em seus territórios por projetos e políticas baseadas numa visão de desenvolvimento insustentável e prejudicial à saúde. A seguir a entrevista com Marcelo Firpo, pesquisador da FIOCRUZ e coordenador geral do projeto do Mapa de Conflitos envolvendo Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil.

O que é Injustiça Ambiental? 

O tema da justiça ambiental surge inicialmente nos EUA, sua origem está relacionada à luta contra a discriminação racial e étnica presente nos movimentos pelos direitos civis da sociedade norte-americana nos anos 70 e 80. Inicialmente foi cunhada a expressão racismo ambiental em função da presença de populações negras que viviam em regiões altamente poluídas por indústrias químicas ou próximas a depósitos de lixo. Algum tempo depois o movimento passou também a usar o conceito mais amplo de justiça ambiental, articulando-se com a defesa pelos direitos humanos universais e incorporando outras questões além da discriminação racial e étnica, como classe social — exploração dos trabalhadores – e gênero – subjugação das mulheres. Na América Latina, somente nos anos 90 é que, aos poucos, a relação entre meio ambiente, saúde, direitos humanos e justiça passou a fazer parte da agenda de alguns países com a adoção do conceito de justiça ambiental.

No Brasil, a criação da Rede Brasileira de Justiça Ambiental em 2001 (www.justicaambiental.org.br) se deu com o lançamento da Declaração de Princípios, na qual o conceito de Injustiça Ambiental foi definido como “o mecanismo pelo qual sociedades desiguais, do ponto de vista econômico e social, destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento às populações de baixa renda, aos grupos sociais discriminados, aos povos étnicos tradicionais, aos bairros operários, às populações marginalizadas e vulneráveis”. Já o conceito de Justiça Ambiental é entendido por um conjunto de princípios e práticas que asseguram que nenhum grupo social, seja ele étnico, racial, de classe ou gênero, “suporte uma parcela desproporcional das conseqüências ambientais negativas de operações econômicas, decisões de políticas e de programas federais, estaduais, locais, assim como da ausência ou omissão de tais políticas”. 

O que é o Mapa da Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil?

O Mapa é um sonho antigo e resulta de um projeto desenvolvido em conjunto pela FIOCRUZ e pela Fase, ONG que sedia a secretaria da Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA). Seu objetivo maior é, a partir de um mapeamento inicial, socializar e apoiar a luta de inúmeras populações e grupos atingidos/as em seus territórios por projetos e políticas baseadas numa visão de desenvolvimento considerada insustentável e prejudicial à saúde por tais populações, bem como movimentos sociais e ambientalistas parceiros. É importante destacar que a noção de saúde inclui também temas como a defesa da cultura e modos de vida tradicionais, a democracia e a violência, já que em inúmeros casos existem ameaças e até assassinatos contra aqueles que lutam por seus direitos.

Como diz nosso site, o Mapa busca sistematizar e socializar informações disponíveis, dando visibilidade às denúncias apresentadas pelas comunidades e organizações parceiras. Os cerca de 300 casos (novos 40 estão sendo introduzidos neste momento) nos vários estados do país foram selecionados a partir de sua relevância socioambiental e sanitária, seriedade e consistência das informações apresentadas. Com isso, esperamos contribuir para o monitoramento de ações e de projetos que enfrentem situações de injustiças ambientais e problemas de saúde em diferentes territórios e populações das cidades, campos e florestas, sem esquecer as zonas costeiras.

É importante ressaltar que não consideramos o Mapa “fechado”. Muito pelo contrário, ele é o momento inicial de um novo espaço para denúncias, para o monitoramento de políticas públicas e, ainda, de desafio para que o Estado, em seus diversos níveis, responda às necessidades da cidadania.

Uma possibilidade de atuação por parte de comunidade ou organizações, que já vem acontecendo, é a denúncia de novos casos, a correção ou atualização das informações sobre os casos existentes. Isso pode ser feito no Fale Conosco que está presente no portal do Mapa na internet.

O uso indiscriminado de agrotóxicos constitui um elemento importante gerador de injustiça ambiental? Há muitos casos no mapa envolvendo os agrotóxicos?

No Mapa a expansão do agronegócio, em especial de monocultivos como a soja e a produção de árvores para a celulose ou a siderurgia, aparece como um das principais causas de injustiça ambiental no Brasil. Tais atividades geram vários efeitos negativos, como a concentração de terras, renda e poder político dos grandes produtores; o desemprego e a migração campo-cidade com impactos no caos urbano das metrópoles dos países periféricos; o não atendimento às demandas de segurança e soberania alimentar, já que o agronegócio está preocupado em produzir as mercadorias agrícolas mais lucrativas e que muitas vezes não são alimentos (caso dos biocombustíveis) ou são exportados como commodities para os países mais ricos. Além disso, a disputa por terras gera conflitos com as populações tradicionais como indígenas, quilombolas, pescadores e extrativistas, além daqueles com agricultores familiares e os movimentos pela reforma agrária.

O uso intensivo de agrotóxicos e agroquímicos, uma das marcas da “modernização agrícola” no Brasil, é também um grande problema. No Mapa aparecem 43 casos de conflitos em que aparece a palavra agrotóxicos. Nem sempre o problema se dá no campo: a produção de agrotóxicos também está presente em tragédias envolvendo trabalhadores e populações urbanas, como nos casos da contaminação de resíduos de agrotóxicos na Baixada Santista pela multinacional francesa Rhodia, em Paulínia (SP) pela Shell, na chamada Cidade dos Meninos em Duque de Caxias (RJ) em que o próprio governo federal é o réu, ou ainda em desastres como o vazamento de milhares de litros do agrotóxico endossulfam pela empresa Servatis em Resende (RJ), que contaminou o Rio Paraíba do Sul e afetou várias cidades e pescadores até a foz do rio, no Norte do Estado.

Como se espera que esta ferramenta possa influenciar o poder público a buscar soluções para os conflitos?

Como já foi dito, uma questão importante é a divulgação destes casos de conflitos e injustiças na opinião pública. Um aspecto da vulnerabilização destas populações é a invisibilidade de seus problemas na mídia e nos debates públicos. Raramente eles aparecem na mídia, ou quando aparecem muitas vezes são apresentados de forma discriminatória: as violências praticadas contra tais populações, os atos de resistência e de defesa de direitos são ocultados ou distorcidos, e são realçadas acusações contra o direito de propriedade dos grandes produtores. O lançamento do Mapa nos últimos meses em vários veículos da mídia e em eventos regionais permitiu lançarmos um olhar contra-hegemônico, o que provocou reações, mas também busca de ações mais efetivas por parte das instituições e, por vezes, das próprias empresas. Há uma fetichização no mundo e no Brasil sobre o que chamam gestão ambiental e responsabilidade social corporativa, pois frequentemente tais práticas não dialogam com as populações e desprezam suas reivindicações.

Outro aspecto muito importante para nós é o uso desta ferramenta por parte das populações e dos movimentos sociais para mostrar o “outro lado” que não aparece nos indicadores de crescimento econômico e desenvolvimento. Também esperamos que instituições democráticas ligadas a setores como a saúde ambiental, o meio ambiente, a reforma agrária, a demarcação de terras indígenas e quilombolas, dentre outros, possam incluir os dados do Mapa para elaborar agendas e implementar suas ações.

O Mapa da Injustiça Ambiental se encontra em: http://www.conflitoambiental.icict.fiocruz.br/
*Flávia Londres é engenheira agrônoma, consultora da AS-PTA

Concentração de terra

08/06/2010
MS e MT lideram ranking nacional em concentração de terra
Pesquisa aponta que “os dois Estados são a simbologia do latifúndio no país”

Por Keka Werneck

O Mato Grosso ocupa o segundo lugar em concentração de terra entre todos os estados do país, conforme cartilha sobre limite da propriedade rural no Brasil, lançada pelo Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo.
Mais de 8.428 propriedades estão acima dos 35 módulos fiscais, teto proposto pelo Fórum. Isso significa que 69% das áreas estão concentrados em latifúndios acima de3.500 hectares. Isto quer dizer que há quase 50 milhões de hectares para Reforma Agrária em Mato Grosso.
De acordo com o documento, “o módulo fiscal é uma referência, estabelecida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que define a área mínina suficiente para prover o sustento e a vida digna de uma família de trabalhadores e trabalhadoras rurais”.
Já o Mato Grosso do Sul ocupa o primeiro lugar em concentração de terra, com 75% das propriedades rurais acima do limite compreendido como justo. Tais dados indicam o tamanho da desigualdade agrária nos dois estados, que, até 1977, eram um só.
Para Gilberto Portes, secretário executivo do Fórum e um dos elaboradores da cartilha, “os dois Estados são a simbologia do latifúndio no país”. Segundo ele, esclarecer isso para a sociedade mato-grossense é de extrema importância.
“Eu tenho a certeza de que muitas pessoas não se dão conta desse disparate, mas agora vão saber”, diz, referindo-se às meias verdades divulgadas nacionalmente sobre Mato Grosso, como ‘eldorado’ para todos. “Não é bem assim. O que há é concentração de terras e de riquezas nas mãos de alguns. E a exploração da mão de obra no campo. Se há desenvolvimento econômico, isso favorece a quem?”, questiona.
“Basta verificar o índice de desenvolvimento humano, para saber que na verdade Mato Grosso é um estado pobre. Onde está o desenvolvimento social? Além disso, esse latifúndio ainda é uma ameaça ao meio ambiente”.
Se por um lado a terra está concentrada nas mãos de poucos latifundiários, de outro lado mais de 100 mil famílias esperam por um lote em Mato Grosso, de acordo com estimativa do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Uma parte dessas famílias - homens, mulheres e crianças - está neste momento em beiras de estrada ou em propriedades ocupadas, vivendo de incertezas, sob barracas de lona preta, sem condições mínimas, lamenta Antônio Carneiro, da coordenação estadual do MST.
Para Inácio Werner, do Centro Burnier Fé e Justiça (CBFJ), tal concentração de terra gera desigualdade social, impossibilita outro modelo de agricultura familiar, não resolve o problema da fome e ainda favorece o trabalho escravo. “Historicamente, o latifúndio é que mantém essa prática”, afirma Werner, que representa o CBFJ no Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Escravo (Foete).
“Essa situação é gritante e vergonhosa para o país”, denuncia Ademir Antônio Montovani, agente da Comissão Pastoral da terra (CPT) em Mato Grosso. Na visão dele, um agravante da concentração de terra é a criminalização dos movimentos camponeses e a violência no campo.
Indígenas e quilombolas também são atingidos por esse problema. Os índios porque vivem em reservas cercadas pelas grandes propriedades rurais, que a todo tempo pressionam para empurrar as cercas e reduzir as áreas garantidas para as etnias. Os quilombolas, porque defendem o direito de ocupar territórios onde viveram seus antepassados, vítimas da escravatura. Sempre que reclamam seus direitos, aparecem como problemáticos.
A cartilha foi publicada com o objetivo de revelar a realidade agrária no Brasil e para fomentar o debate popular sobre o limite da propriedade rural. Um plebiscito será realizado de 1 a 7 de setembro, por meio do qual o povo brasileiro irá responder quanto de terra alguém pode concentrar.
A resposta do povo poderá abrir caminhos para a criação de um Projeto de Emenda Parlamentar (PEC) ao Artigo quinto da Constituição Federal que trata da propriedade, inclusive a rural (item XXIII).
O plebiscito vai, assim, levar tal discussão sobre terra para a semana da Independência do Brasil, que culmina com o Grito dos Excluídos, caminhada na qual os movimentos sociais mostram que o país ainda tem muito o que fazer para ser de fato livre e em favor da soberania nacional.
Na avaliação de Gilberto Portes, antes de mais nada é preciso conscientizar a população para depois levar essa matéria ao parlamento. “Sabemos que a bancada ruralistas no Congresso Nacional tem cerca de 350 deputados federais. Sem pressão popular jamais conseguiremos aprovar uma PEC. Mas o projeto Ficha Limpa vem nos inspirar e mostrar que, se o clamor vem do povo, podemos sim provocar transformações. E vamos trabalhar para isso. O que não podemos aceitar mais é essa posição do Brasil: segundo país em concentração de terra do mundo (perde só para o Uruguai).”
Além de debates e do plebiscito, um abaixo-assinado já está correndo em todo o país e em mais de 20 municípios de Mato Grosso.
A ideia, com tudo isso, é dar visibilidade à realidade agrária brasileira, coisa que os meios de comunicação não têm dado conta de fazer. Na visão da jornalista Mayrá Lima, do Intervozes Brasil de Comunicação, “assim como o parlamento, a mídia burguesa também tem alianças econômicas com o agronegócio. Sabemos que alguns grupos de comunicação defendem os interesses de uma classe e acreditam inclusive que a reforma agrária é assunto superado, como se isso não fosse resolver problemas sociais do campo e da cidade”..
Censo Agropecuário do IBGE, 2006, mostra que esse domínio existe até hoje. Um pequeno número de fazendas (0,91% de todas) ocupa a maior parte do solo nacional (44,42%). Enquanto a maioria das propriedades (2.477.071) são muito pequenas e ficam limitadas a 2.36% do território nacional. 

Mais informações sobre a cartilha: 
www.limitedaterra.org.br
(da Assessoria de Imprensa do Centro Burnier Fé e Justiça)